Ali
onde tudo é possível
Um
equilíbrio de pé ante pé numa singeleza de voo de borboleta
Um
córrego pelas linhas do eléctrico a desaguar no Tejo
Águas
de levada, sonhos, ânsias, brisas
Mesmo
mesmo mesmo em frente à Sé, por cima das pedras fenícias, gregas, romanas, mouras, pedras com
pedacitos da pele de quem por lá andou, ouvem-se
ainda os gritos do povo a chamar a revolta. “Querem matar o Mestre! Querem
matar o Mestre”
E o
sol a girar, a girar, no milagre anual do Fernando de Bolhões
E o
Cesário, o Verde
E tudo,
mas mesmo tudo misturado no fado
Tudo
a ir
A
misturar-se com as águas do Bugio... com as naus e as caravelas e os veleiros
de três mastros a zarparem para os Brasis que em Lisboa já se fala francês...
O Rei
e a Carlota Joaquina e a resma de piolhos e de cortesãos empoeirados que foram
com eles, mais a régia biblioteca que por lá ficou.
Imagino
os molhos de sertão e de samba e de escravos negros, polidos a óleo de amendoim
e a talhe de chicote, que a boa da Carlota não deve ter desmamado lá nos
biombos da corte tropical...
Agora
não...
Anda
tudo acinzentado numa maleita que ninguém entende... em lugar de fuba, milho
transgénico, em lugar do vinhinho da torna, água choca...
Uma
tristeza sem fim, é o que é.
Tudo
tristonho, de ventas afiveladas ao chão, os passos arrastados, as mãos
escondidas nas algibeiras... volta e meia um pontapé numa pedra a enganar o
tédio e pouco mais.
Pre-ci-sa-mos
de u-ma re-vo-lu-ção!
Precisamos
mesmo! Uns tiros, uns estalos, uns corpos a esmo, espalhados no Rossio, mais
uns cadáveres do reviralho ali para as bandas de S. Bento e a coisa faz-se. Olá
se faz...
Imagino
as fragatas no Tejo, mais os submarinos, a bombardearem Belém com projécteis de
bolo rei... e a artilharia da Ajuda a responder-lhes com pastéis de nata...
depois da Revolução dos Cravos a calórica Revolução do Açúcar...
Seria
uma festa!
Mas
não, já nada disso é possível... agora só nos resta esperar... esperar e cantar
o fado, o menor, claro está.
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