(foto de Luis Mariano Guimarães)
No sábado passado mais de trezentas mil pessoas, manifestaram a sua revolta contra as medidas que este governo tem vindo a aplicar sob o pretexto de combater a crise.
Um mar de gente a descer a Avenida da Liberdade, horas a fio, numa das maiores manifestações de protesto de que há memória na história da segunda República.
A imagem que me ocorre para ilustrar a sua dimensão, é a de um anfiteatro com a capacidade de seis estádios da luz, repleto, com o governo no centro e todos os ocupantes, de dedo apontado a gritar em uníssono, que estas medidas não servem, que são contra os interesses da grande maioria dos portugueses, que são tomadas em troco de uma mão cheia de nada, para garantir apenas a manutenção de uma sociedade desigual em que poucos continuam a crescer enquanto a esmagadora maioria vê esvaírem-se as perspectivas de um futuro no mínimo decente, como se fossem grãos de areia a escorrer por entre os dedos.
Dir-se-á que uma manifestação é apenas isso; uma manifestação, com maior ou menor impacto. Porém se enquanto acto isolado não passa de um lembrete, um aviso quase inócuo de que parte da sociedade está insatisfeita com o desenrolar dos acontecimentos. Enquadrada, é muito mais do que isso, pois se matam assim dois coelhos de uma só cajadada: vive-se numa democracia e respeita-se o direito a manifestar de forma organizada o protesto e ao mesmo tempo afirma-se a decisão inabalável de admitindo o direito à indignação, prosseguir o rumo antes traçado.
É-se democrata porque se ouve, é-se determinado porque se persiste no mesmo trilho, apesar das vozes contra.
Só que por vezes, esta receita não funciona, e, neste caso, para além das trezentas mil pessoas que afirmaram presença em Lisboa, muitas outras, dos milhões que ficaram em casa, perceberam que é possível alterar o rumo das coisas, e que a única forma que têm de o fazer é participando, perceberam que há mais democracia para além do voto. Como antes já tinham percebido que se está a viver o maior ataque à nossa soberania desde as invasões francesas, desta vez o exército invasor não tem rosto visível, mas todos sabemos quem são os seus generais e todos sabemos que o português não é a sua língua.
Essa língua é a dos mercados, da especulação, dos números desumanizados, em que homens são dados estatísticos, colocados convenientemente em mapas gráficos, no software da ganância.
Comentários
Enviar um comentário