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cerração


Ponte Vasco da Gama. Lisboa velada por um manto de brumas. Os miúdos a dormir.
Eu cheio de pensamentos, a cruzarem-me o cérebro como asteróides.
O rádio a dar notícias, como pãozinhos quentes, esperança e paz e amor e solidariedade e o rio por baixo, cinzento como o Hudson; momento triste de viver.
Na cidade, as ruas com habitações em prateleiras, carros, muitos carros comandados por luzinhas que acendem e apagam e piscam e acendem outra vez, um desconforto.
Mouraria! chegamos! paro o carro junto a uma parede que dá dinheiro se carregarmos nas teclas certas... desta vez acertei, saíram umas notas de um orifício e dei-as aos putos.
Entretanto, por uns segundos se fez luz, alguém conhecido passeava no desconsolo deste domingo.
" Olha olha o Tó Zé Chaparreiro, o homem que nunca tem dinheiro".
Parou, olhou para mim e disse:
"Olha olha o Miguel Sampaio, que diz mais disparates que um papagaio".
Abraçamo-nos, já não nos víamos há tanto tempo...
Conversamos, dissemos adeus e seguimos viagem, ele para o seu destino, eu para deixar os putos na mãe.
Devia haver um paralelo a marcar fronteira entre ela e eu, de um lado ela, do outro eu...
Mas não é assim e pronto.
Deixei os filhos e vim para Évora, depressa, a deixar o nevoeiro para trás, a envolver a cidade que já foi minha, mas que agora não.
Mesmo apesar do Bairro Alto e da Bica e dos Olivais.
Já não, nem o nevoeiro me seduz. Sei bem que não cobre o desejado.

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