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O Cemitério


Lisboa é uma cidade fascinante.
Tem um Centro Histórico, que muito embora, ainda não seja património mundial como o de Évora, ou Porto, ou Ponta Delgada, para lá caminha.
Tem museus; alguns. Como o museu Gulbenkian, o museu de arte contemporânea, o museu nacional de arte antiga, o museu do chiado, até um museu das marionetas, e vá-se lá saber porquê um museu etnográfico.
Lisboa, é sem dúvida uma referência para o resto do país, a sua oferta cultural é tão grande, tão diversificada, que finalmente alguém percebeu que existe um nicho de mercado, com excelente retorno, para as actividades ditas culturais.
A coisa, segundo ouvi dizer até funciona bem. O estado disponibiliza um espaço, tipo Centro Cultural de Belém, completamente infraestructurado, e diz: Temos aqui este sítio, tão bem arranjado, a dar prejuízo, sem que ninguém se aperceba sequer do esforço que fizemos para o construir, para o erguer, para o equipar…
-Não está certo, melhor será que o disponibilizemos a um coleccionador, um mecenas, em suma, alguém que não se importe de preencher estas galerias com a sua colecção privada.
Até porque um museu, como toda a gente sabe, é um sítio onde se pode ver apenas aquilo que é único, o que jamais em circunstância alguma poderá ser objecto de cópia ou reprodução.
O museu é estático, perene, inalterável, como a cultura: o museu é a âncora, a rocha, o firmamento, da actividade cultural. Pedrada no charco, sem dúvida, com os infindáveis círculos concêntricos a desenvolvendo-se a partir da ideia original.
Vendem-se entradas, vendem-se teses simpáticas, vendem-se sandes e coca-colas no bar de suporte.
O mercado funciona, a cultura agradece.
Esta conversa toda porque outro dia fui ao cemitério dos Prazeres, para visitar a campa de um amigo e me cobraram seis euros à entrada.
- Seis euros? Perguntei indignado. Seis euros para entrar num cemitério?
- Não! Responderam-me, isto agora não é um cemitério, é um museu. Nada aqui é reprodutível no exterior, ou vem cá e tem a oportunidade de ver “in loco” o original, no caso a campa do seu amigo, ou permanece na ignorância, nesse obscuro pesar de imaginar como poderia ter sido a contemplação de uma obra irrepetível, como a campa do seu amigo.
Perante tão sábios argumentos, lá paguei o que me exigiram e fui direito à campa do Lopes, digamos assim. Mas lá chegado, deparei-me com dois oficiais de diligências, mais um delegado do ministério público e uma série de gente com ar circunspecto em torno da campa do meu amigo.
- Estão a exumar o corpo? Perguntei entre o estupefacto e o indignado.
- Não. Esclareceram-me, trata-se de uma exposição temporária. É que o caixão do Lopes é um exemplo brilhante de “Art Déco”, uma magnífica peça de “Design”.
Quem diria? Logo o Lopes que até era canteiro…
Isto das actividades culturais…
Se a moda pega ainda vamos ver uma coisa parecida aqui por Évora…  
Até para a semana.

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