A cultura da transparência e a transparência da cultura.
A democracia não existe sem investimento na cultura. Não é viável, porque é através dela que entendemos o outro. É através dela que integramos a noção de diferença, e é através da diferença que podemos afirmar os nossos valores. A cidadania não é um espaço em branco, vazio, unanimista; muito pelo contrário, é um espaço de debate, de contraditório. É através desse contínuo confronto de ideias que tomamos consciência do poder que detemos, que votamos, que delegamos o mando que é nosso, naqueles que se disponibilizam para gerir a coisa pública.
A noção de que não somos os servos, mas sim os senhores, a certeza de determos a chave do nosso destino colectivo, a firmeza de devermos mais do que podermos, pedir contas a quem entregamos provisoriamente o direito de nos representar, decorre da liberdade, igualdade, fraternidade, da revolução francesa, que colocou todos os homens no mesmo patamar.
Direitos iguais implicam iguais oportunidades de acesso à cultura, à possibilidade de lutar com as mesmas armas.
É esta na sua essência a transparência da cultura e é ela que nos impõe enquanto homens livres, a cultura da transparência.
É ela o fundamento da democracia.
Dito isto, pergunto porque motivo aqueles que escolhemos para nos representar na governação do nosso país, ocultaram a existência de uma agenda de privatizações até à divulgação do PEC, que sabiam ser no mínimo controversa e que, caso fosse sujeita a escrutínio público seria rejeitada pela maioria dos portugueses?
Porque motivo mentiram?
Mentiram por apego ao que o exercício do poder oferece, escamotearam a verdade, porque sabem que não governam um país de súbditos, sabem que conhecidas as suas intenções, não seriam certamente eleitos.
Cesteiro que faz um cesto, faz um cento. Por isso pergunto, se privatizam os CTT, se privatizam a REN, porque não se referem à água no PEC?
Não vão mexer na água?
Ou vão primeiro possibilitar que se atribua a distribuição em baixa a empresas que já a fazem em alta, para depois, daqui a um par de anos, quando tudo estiver a funcionar convenientemente, abrir a gestão dos recursos hídricos a empresas de capital exclusivamente privado?
É que a água é um monopólio natural, o acesso a ela, um direito consagrado.
Ninguém pode ficar privado de água.
Universalidade, Equidade, Qualidade, Sustentabilidade, não são palavras vãs.
Já agora gostaria de perguntar se o facto da Câmara Municipal ter começado finalmente a cobrar as dívidas referentes ao consumo de água e o concurso para admissão de novo pessoal qualificado aberto pela ACA, estarem a acontecer em simultâneo, é mera coincidência.
Só por uma questão de transparência.
Para que se saiba dia 1 de Janeiro deste ano a cidade de Paris remunicipalizou a distribuição em baixa.
Pergunto. Porque será?
Até para a semana.
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