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Os Miseráveis



Os partidos do centrão, (ou o partido do centrão) chumbaram a limitação das remunerações dos gestores públicos.
Entende-se. Uma coisa é arvorarem-se uns em defensores do Estado Social, outros em paladinos dos bons costumes, outra coisa diferente é admitirem mexidas no seu sistema de distribuição de prebendas, que é a cenoura acenada aos aspirantes a boys ou a seniores e lhes permite controlar o aparelho de Estado, é a tuberosa que lhes serve de sustentáculo para a alteridade, que os perpetua no poder e que vendem como alternância.
Permitem-se reagir indignados, como se foram os donos da verdade, quando alguém os censura pelo estado da nação. Com o desemprego a aumentar, o trabalho precário como regra, os salários de penúria, os cortes nas regalias sociais, o aumento das prestações sociais de todas as formas e feitios, o desinvestimento na educação e na saúde, a abdicação da soberania nacional, a entrega passiva das nossas expectativas de futuro exactamente nas mãos de quem nos sufoca o presente. 
Mentem e encenam as mentiras comuns com desacordos ilusórios e agem em conjunto na defesa das suas regalias, do seu estado de opulência enquanto os demais mirram.
São pobre e medíocre gente, que foge da transparência, do debate e do mérito como o diabo foge da cruz.
Hoje chegou às minhas mãos um texto paradigmático (assinado por José Alberto Gueiros) que aqui reproduzo:

"Quando Winston Churchill, ainda jovem, acabou de pronunciar seu discurso de estréia na Câmara dos Comuns, foi perguntar a um velho parlamentar amigo de seu pai, o que tinha achado do seu primeiro desempenho naquela assembléia de vedetes políticas.

O velho pôs a mão no ombro de Churchill e disse, em tom paternal:
- "Meu jovem, você cometeu um grande erro. Foi muito brilhante neste seu primeiro discurso na casa. Isso é imperdoável. Devia ter começado um pouco mais na sombra. Devia ter gaguejado um pouco. Com a inteligência que demonstrou hoje, deve ter conquistado, no mínimo, uns trinta inimigos. O talento assusta."
E ali estava uma das melhores lições de abismo que um velho sábio pode dar ao pupilo que se inicia numa carreira difícil.
A maior parte das pessoas encasteladas em posições políticas é medíocre e tem um indisfarçável medo da inteligência.
Não é demais lembrar a famosa trova de Ruy Barbosa:
"Há tantos burros mandando em homens de inteligência que às vezes fico pensando que a burrice é uma ciência".
Temos de admitir que, de um modo geral, os medíocres são mais obstinados na conquista de
posições.
Sabem ocupar os espaços vazios deixados pelos talentosos displicentes que não revelam o apetite do poder.
Mas é preciso considerar que esses medíocres ladinos, oportunistas e ambiciosos, têm o hábito de salvaguardar suas posições conquistadas com verdadeiras muralhas de granito por onde talentosos não conseguem passar.
Em todas as áreas encontramos dessas fortalezas estabelecidas, as panelinhas do arrivismo, inexpugnáveis às legiões dos lúcidos.
Dentro desse raciocínio, que poderia ser uma extensão do Elogio da Loucura de Erasmo de Roterdão, somos forçados a admitir que uma pessoa precisa fingir de burra se quiser vencer na vida.
É pecado fazer sombra a alguém até numa conversa social.
Assim como um grupo de senhoras burguesas bem casadas boicota automaticamente a entrada de uma jovem
mulher bonita no seu círculo de convivência, por medo de perder seus maridos, também os encastelados medíocres se fecham como ostras à simples aparição de
um talentoso jovem que os possa ameaçar.
Eles conhecem bem suas limitações, sabem como lhes custa desempenhar tarefas que os mais dotados realizam com uma perna nas costas, enfim, na medida em que admiram a facilidade com que os mais lúcidos resolvem problemas, os medíocres os repudiam para se defender.
É um paradoxo angustiante.
Infelizmente temos de viver segundo essas regras absurdas que transformam a inteligência numa espécie de desvantagem perante a vida.
Como é sábio o velho conselho de Nelson Rodrigues:
"Finge-te de idiota e terás o céu e a terra".
Está tudo aqui. Escarrapachado.
Este texto é bem o retrato de quem tem governado este país.
Uma multidão de boys, rosa e laranja, movidos pelos seus interesses pessoais, mesquinhos e redutores do mundo, porque o mundo... apenas o  entendem à sua dimensão.
Tudo o resto lhes mete medo.
(Este texto foi publicado no "Jornal da Bahia em 1979)





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