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Neo-Bufos


O DCIAP (Departamento Central de Investigação e Acção Penal) lançou um portal para que se possam fazer no mais estrito anonimato denúncias sobre casos de corrupção, garantindo que as referidas denúncias, desde que fundamentadas, serão alvo de investigação e que o denunciante será informado de todos os passos do processo.
Se o caso seguir para tribunal, serão dadas todas as garantias ao denunciante de que a sua vida pessoal e profissional, não sairá beliscada, pelas suas revelações serem levadas à justiça.
Confesso o meu espanto; segundo julgo saber, em Portugal essa medida não é inédita. Nos tempos da Inquisição era prática corrente a denúncia anónima, voltou a sê-lo nos tempos do fascismo e convém salientar que de ambas as vezes resultou em pleno, excedeu mesmo as previsões mais optimistas e muita gente acabou por ser queimada, presa, degredada em consequência de tais práticas.
Dir-me-ão que é diferente, que agora tal medida se destina a revelar os prevaricadores de um crime difícil de investigar e cuja prática, além de desviar milhões dos cofres do Estado, desvirtua o sentido da democracia, criando situações de privilégio inadmissíveis numa sociedade como a nossa, que se pretende livre e igualitária.
É verdade que a corrupção tem de ser combatida, que constitui um grave, senão o mais grave problema com que nos confrontamos. Mas também é verdade que os meios não justificam os fins, que da denúncia anónima a um acto de bufaria vai apenas um pequeno passo, do mesmo tamanho do passo que separa o Estado de Direito de um Estado Policial.
Quando um país que possui legislação, meios de investigação, que pode cruzar dados entre os diversos departamentos de estado se dispõe a institucionalizar a denúncia anónima como instrumento de combate a determinado crime, seja qual for a sua gravidade, está a abrir uma caixa de Pandora, a relegar para segundo plano aquilo que é um dos pilares do estado democrático e que é a prática da cidadania. Um cidadão não é, não pode ser um denunciante anónimo, mesmo que por medo de represálias. O Estado tem como dever proteger os seus cidadãos, tem como obrigação impedir que o medo determine as relações laborais ou de outra ordem, qualquer que ela seja.
Se para combater um crime se recorre ao anonimato, esse Estado deixa de ser um estado democrático, para passar a ser um Estado em que eventualmente a democracia acontece, ou talvez não.
Passa a ser um Estado que admite ter no seu seio criminosos de tal forma instalados nos meandros do poder que a única forma de os combater é sujeitar o seu povo aos métodos da Santa Inquisição ou da Pide.
Eu não quero ter de passar por isso mais uma vez que seja.

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