Avançar para o conteúdo principal

Lá Vai Calitro Oh Toino (cont.)

“Não estou a pedir desculpa, coisa nenhuma! Estou apenas a ensaiar uma aproximação tipo “coisa fina”, uma aproximação teatral”.
“ Ah… mas de onde tiraste a ideia que eu aceito essa aproximação?”
“Não tirei de lado nenhum, mas se não quiseres que me aproxime quem fica a perder és tu. Afinal de contas sou uma pessoa muito interessante, apesar de não saber aproximar-me.”
“ Se o dizes” retorqui com indiferença.
Virei-me na direcção da voz e o espanto apoderou-se de mim. Era Cláudia Cristal que estava ali ao meu lado, a falar comigo… a Diva canora, a estrela do momento.
O meu coração melómano deu em bater descompassado, a garganta secou e as mãos, húmidas, contorceram-se em espasmos de frenesim erótico.
A Cláudia Cristal, ali, ao meu lado, num autocarro.
“ Imagination n’est pas don mais par excellence object de conquête” sussurei.
“Un peu avant minuit près du débarcadère” respondeu a sorrir. Depois levantou-se e saiu sem me dar tempo de a seguir.
A viagem terminara ali, pouco antes do meio-percurso, saí e olhei em volta ainda aturdido.
Na rua a noite começava a cair antes de tempo, com estondo, avancei pelo interminável barulho dos neons até encontrar um sítio para comer; não um lugar qualquer, apetecia-me um espaço com luz verde e portas de saloon, um lugar musical com refeições vegetarianas.
Como por encanto, encontrei-o quase de imediato. Sobre a porta de saloon, um cartaz indicava-nos o nome: restaurante Verdepim comida vegetariana para extraterrestres e vizinhos do lado.
Entrei. Lá dentro tudo era verde, sentei-me numa cadeira verde e peguei numa ementa verde, que estava sobre a toalha verde, a cobrir a mesa verde.
De imediato fui atendido por um homem de tez esverdeada.
“ Ai se não morresse nunca, e eternamente buscasse e conseguisse a perfeição das coisas…” (Cesário Verde)
“Pode ser uma sopa de tomate e um copo de três tinto” retorqui.
“ certo, muito embora o deva avisar que a nossa sopa de tomate é alucinogénica e nesse caso talvez fosse preferível beber uma groselha”.
“Traga-me então a groselha”…
“ Ah!” exclamou, “o meu nome é Miguel, Miguel Michael. Digo-lhe isto porque pode vir a precisar dos meus serviços. Dou aulas de dança nas horas vagas.”


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Viva a globalização II

WILSON from Arnaud Bouquet on Vimeo . Vou postar todos os dias um video com lágrimas. Um video do absurdo e da estupidez. Um video da insanidade deste mundo que habitamos. Da esquizofrenia global. Da imensa tristeza de habitar tal espaço...

A historia da Girafa sem Pescoço

Era uma vez uma girafa, muito simpática, que morava numa enorme savana, lá bem no coração de África. Mas a nossa amiga girafa, não era completamente feliz. Tinha uma pequena mágoa sempre a roer-lhe a alma. À primeira vista ninguém conseguiria dizer que ela não era uma girafa como as outras, com o seu enorme pescoço e as manchas castanhas a cobrirem-lhe o corpo amarelado. Como as outras girafas, tinha o seu jeito desengonçado de andar e o hábito de mastigar as folhas que ia tirando das árvores. Quem a visse diria sem qualquer dúvida que ela era uma vulgar girafa, a viver a vida de todas as girafas, mas não era bem assim. Lá na savana, ao cair da noite, todos os animais se juntavam e conversavam, contavam histórias e cantavam juntos canções que iam inventando no momento, mas, a nossa amiga limitava-se a ouvi-los, porque da sua garganta não saía nem um ai. Por ter um pescoço tão grande, ela não conseguia emitir qualquer som, mesmo o mais insignificante e  era essa a causa da sua melanco