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Lá vai Calitro oh Toino


Acordei de ressaca, narinas entupidas, náuseas e o mais que se sabe...
A casa de banho ali ao lado e o espelho de bolso ainda no chão. Peguei num cigarro, lambi-o até ficar impregnado de saliva peganhenta, e passei-o metodicamente pelo espelho, de seguida fui até à saleta e peguei num copo com uísque ainda sem moscas, bebi de um trago acendi o cigarro e abri a janela; yesse!
Na rua as pessoas deslocavam-se aos saltinhos e acenavam-me com lenços brancos, fiquei um bocado à toa.
Mas que é esta merda, pensei, estes monos que não me conhecem de lado nenhum, a acenarem lencinhos brancos...
Corri para o telefone e liguei, bastante preocupado, para o S.O.S. Você Está Mesmo À Toa. “Ca tem problema”, disseram do outro lado, “bo stá numa crise de andropausa, os lencinhos acenam despedidas à sua juventude, acontece”.
Fiquei mais tranquilo, vesti-me, peguei no guarda-chuva e saí de casa todo lampeiro. O destino não era incerto, já tinha a rota traçada para uma charcutaria jeitosa que me abria os apetites. Assim que lá cheguei, depois de cumprimentar o dono do estabelecimento, Zás! Dirigi-me aos ananases e pimba! Trespassei-os um a um com a ponta acerada do guarda-chuva...
Ah! Que alívio, nada como uma boa trepanagem para nos revigorar.
Entretanto de uma esquina relativamente próxima surge a mais sensual das balzaquianas que alguma vez vi; visão efémera, porque ela entrou num autocarro que se foi tornando pequenino, pequenino, até o perder de vista.
Não desistas, não desistas, agonizavam os ananases, e eu não desisti, apanhei a custo um autocarro idêntico e segui na peugada dela. Não tinha muito dinheiro comigo e o bilhete que comprei, de classe turística, dava para pouco mais que meia deslocação para onde quer que fosse; que se lixe, pensei, também nem sequer sei para onde vou, sentei-me num dos bancos disponíveis e deixei-me ir.
Je vous demande pardon...
Foi o que me chegou ao ouvido esquerdo, nem me atrevi a olhar, mas respondi que estava tudo bem.
Depois pensei, tás-me a pedir desculpa de quê?
Tás-me a pedir desculpa porquê?
(continua  um dia  destes à tarde)

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